domingo, 4 de outubro de 2009

Sudário das Alagoas.


Para quem não sabe do que se trata, o Santo Sudário é o tecido de linho que envolveu Jesus Cristo após sua morte. Depois da crucificação Jesus estava todo ensanguentado, com as marcas dos ferimentos e estas marcas ficaram no tecido, como uma fotografia de seu corpo.

Mas o sudário ao qual me refiro foi feito por outra técnica, muito simples e muito eficaz.

Recebemos no hotel, no interior de Alagoas, uma hóspede que deciciu inovar nos métodos de confecção de sudários. A broaca hospedou-se num fim de semana, vindo de Maceió. Passou o sábado inteiro na piscina do hotel, besuntada de blondor e água oxigenada 2 mil volumes, afinal tinha que ficar com TODOS os pêlos do corpo louríssimos.

Cansada, no final do dia, a broaca deciciu subir para o apartamento para tirar uma sonequinha. Cansada como estava, tirou toda a roupa e deitou-se na cama, esquecendo-se de tirar a colcha azul ou de pelo menos tomar uma ducha para tirar o excesso de blondor e água oxigenada (ou talvez quisesse que estes agissem na sombra também).

No dia seguinte, domingo, a camareira foi à recepção com a colcha do apartamento da broaca: o sudário das Alagoas. Podia-se distinguir o corpo da moçoila marcado na colcha, em enormes manchas amareladas, desbotadas em contraste com o restante da colcha, azul royal. Como sempre se faz em casos de danos ao patrimônio do hotel, debitamos da conta da hóspede o valor da colcha e a deixamos dentro de um saco plástico para a hóspede levá-la para casa depois de pagar pelo dano.

Como todos os hóspedes tinham concessão de late check out (sair do hotel à tarde), a broaca apareceu com seu marido para pagar a conta por volta de 17 horas. Ao receber a conta, o marido questionou o recepcionista sobre uma comanda de "diversos" lançada com um valor relativamente alto (a colcha não estava à venda, portanto o hotel poderia cobrar o preço que quisesse, sem falar que as colchas haviam sido tecidas à mão por uma artesã pernambucana). O recepcionista, educadamente, pegou a colcha dentro do saco plástico e colocou sobre o balcão, explicando o motivo da cobrança. O marido, alterado, chamou a esposa e mostrou a colcha.

- Mas quando chegamos ao hotel a colcha já estava manchada - disse a esposa cínica.

O recepcionista insistiu que a colcha estava sem nenhuma mancha, e que não se coloca enxoval danificado no apartamento, e que com certeza o dano foi causado pelos hóspedes. Como sempre acontece em caso de hóspede cheio de razão, veio a tradicional frase:

- Isto é ridículo! Já me hospedei nos melhores hotéis do mundo e isto nunca aconteceu com a gente.

O recepcionista me chamou na recepção para conversar com o hóspede. Após diversas ameaças, o marido pagou a conta e exigiu levar a colcha com ele. Quitamos as contas, emitimos a nota fiscal e a esposa saiu carregando o saco plástico com seu sudário. Imagino o clima no carro de volta a Maceió... deve ter sido uma briga só.

Mulheres, usem blondor, água oxigenada, tinta de cabelo e tudo o mais para ficarem bonitas e gostosas. Mas não manchem colchas, lençóis, toalhas e fronhas do hotel. É impressionante a quantidade de toalhas perdidas com manchas de tintura de cabelo, pisos de banheiros (tapete) manchados com gracha de sapato de executivos, etc.

Danificou? PAGOU!

Gavião não gosta de vermelho!


Este fato aconteceu no hotel de Búzios, onde fui gerente geral.
Um dos grandes problemas de trabalhar em hotéis que têm um único proprietário é ter que receber todos os parentes do proprietário com tarifa ZERO. Depois o dono fica reclamando que a diária média está baixa mesmo tendo uma taxa de ocupação alta. Craro, né Cróvis! Basta prestar atenção nas aulas de hotelaria que você descobre que quanto mais hóspedes com tarifa ZERO maior é a taxa de ocupação e menor é a diária média... humpf!

Mas então... um belo sábado recebemos a irmã do proprietário com seu digníssimo esposo. Ficaram hospedados num chalé próximo a um dos cajueiros do hotel. Neste cajueiro morava um gavião muito bonito. Tínhamos muito orgulho do bicho, pois apesar do barulho e da rotatividade de pessoas, ele fez seu ninho no cajueiro e tinha lá seus filhotes.

Ao chegar ao seu chalé, a Dona Fulana estava de chapéu, óculos escuros (daqueles que cobrem a testa e as bochechas) com muitas jóias, muitas plásticas e muito botóx. Entrou no chalé, trocou-se e, com biquini de grife e canga de artista plástico, saiu rumo à piscina, onde seu marido estava e já havia tomado umas duas garrafas de uísque.

Ao sair do chalé, com seus óculos Chanel e com o chapéu na mão, a Dona Fulana nem conseguiu chegar ao meio do gramado, pois o gavião, ao ver aquela farta cabeleira vermelha, tão vermelha de causar inveja ao próprio Curupira, saiu do seu ninho piando alto e deu um vôo rasante na peruca da perua. A mulher ao se sentir perseguida, saiu correndo com a águia atrás. Chegando ao restaurante, Dona Fulana estava com os cabelos desgrenhados e alguns ferimentos na testa e no couro cabeludo, resultado das garras do gavião na sua cabeça.

A governanta pegou o kit de primeiros socorros e limpou as marcas de sangue e os ferimentos da digníssima senhora. Nada grave, só alguns arranhões que nem marca deixaram.

Seu marido, com sua pança enorme, ficou na piscina, ignorando o acidente de sua esposa. Dona Fulana colocou seu chapéu e saiu para a piscina, depois de um grande copo de suco de maracujá e algumas pílulas de calmante. Mas saiu na maciota, olhando para todos os lados e esgueirando-se pelas espreguiçadeiras.

O dia transcorreu perfeito, muito sol, muita diversão e muitas futilidades com suas amigas... a perua esqueceu o ocorrido.

No fim do dia, Dona Fulana decidiu voltar ao seu chalé, novamente sem chapéu. Devia estar meio grogue pelo efeito dos calmantes, do suco de maracujá e dos diversos Dry Martini consumidos à beira da piscina.

Novamente, ao chegar no meio do gramado, lá veio o gavião em seu vôo rasante, com as garras direto na peruca de Curupira da perua. A coitada correu tanto e tão rápido, que chegando ao seu chalé entrou voando e foi direto ao banheiro onde fechou a porta. Incrível foi o gavião entrar no chalé e ficar voando pelos cômodos procurando sua vítima. Vocês acham que alguém teve coragem de entrar no chalé para tirar o bicho? É ruim, hein!

Depois que o gavião desistiu, um rapaz da manutenção do hotel entrou e avisou a madame que já estava tudo bem. Nesta noite a perua ficou trancada no chalé e pediu seu jantar pelo room service.

No dia seguinte a perua estava escolada: enrolou um lenço na cabeça, ligou para a recepção do hotel e pediu que alguém fosse buscá-la no chalé com um guarda-sol. Tudo deu certo. Sorte nossa que já era domingo e todos iriam embora no fim do dia. Nenhum outro acidente foi registrado, mas o modelito da perua parecia mais um turbante o Ilê Aiê do que um singelo e barato lenço florido amarrado na cabeça.

Este foi o único incidente com o gavião no hotel. Depois disto a perua ficou um bom tempo sem aparecer, assim como seu marido e outros parentes. Foi um período tranquilo, sem cortesias de casa, comida e roupa lavada... e com nossos estoques de uísque sempre em dia.

Depois fui transferido para Maceió.

Cuidado mulheres: a cor vermelha não irrita só os touros não! Pensem bem antes de tingirem seus cabelos!