sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

IOBOSEO

Trabalhava num flat daqui de São Paulo, por volta de 1994. Como todo flat, existiam lá moradores, hóspedes de curta permanência e mensalistas. Não é necessário dizer que alguns espécimes raros frequentavam o estabelecimento, alguns muito chatos e outros divertidíssimos, algumas garotas de programa e alguns tarados, alguns brasileiros e alguns estrangeiros. Dentre estes estrangeiros, relato a seguir a história da Dona Ioboseo... claro que o nome dela não é este, aliás nem imagino o nome dela, já que nome de coreano não é tão simples como todos imaginam.

Esta senhora era mensalista e não me recordo o que fazia no Brasil. Lembro-me de uma negra lindíssima de Gana que vinha ao Brasil comprar móveis e artigos e decoração para sua loja em seu país; lembro-me de uma garota de programa que sempre pedia pizza aos domingos à tarde e comíamos todos juntos, recepcionistas, mensageiros, telefonista e quem mais aparecesse; lembro-me de muita coisa, mas o que a coreana fazia nem me passa pela cabeça: Ilka, se estiver lendo me refresca a memória.

Pois bem, esta senhora tinha uma deficiência visual muito acentuada e usava óculos de fundo de garrafa.

Não bastasse este detalhe, a mulher não falava uma palavra em português, inglês, espanhol, italiano ou francês (o que bastaria pra gente tentar se entender). Ela era muito, mas muito simpática, mas nossa comunicação se restringia à Comunicação Internacional por Sinais. Ela sempre pedia para usar o telefone da recepção e sempre ouvíamos a palavra ioboseo (iôbossêô)... depois descobrimos que esta palavra correspondia ao nosso "ALÔ".

Pois bem, um belo dia a Dona Ioboseo, como sempre, pediu para usar o telefone da recepção com o tradicional gesto hangloose com o mindinho próximo à boca e o polegar próximo ao ouvido. A recepcionista, que estava ao telefone na outra estremidade do balcão, apenas fez um gesto de "positivo" e a Dona Ioboseo, debruçada sobre o balcão da recepção, começou a discar o número desejado no aparelho.

Não sei quanto tempo se passou, mas a recepcionista entra de repente no back da recepção e diz:

- Muri, você tem que ver isso!

A propósito, Muri sou eu... apelido de faculdade... oriundo de Muriçoca, trocadilho nada original com meu sobrenome Maniçoba. Culpa da Doris Ruschmann... mas tudo bem, aceitei e incorporei!

Quando entrei na recepção, a calculadora sobre o balcão já tinha mais de metro de papel da bobina, sendo cuspido a todo instante, pois a Dona Ioboseo, ao invés de teclar os números no aparelho telefônico, o fazia na calculadora. E a mulher já estava nervosa pois sua ligação não completava.

Gentilmente, peguei o aparelho telefônico, coloquei sobre o balcão e saí da recepção correndo pra não cair na gargalhada na frente dela. Desculpem, mas não é preconceito. Até entendo a dificuldade dela, mas a situação foi muito engraçada.

Nenhum comentário:

Postar um comentário